O Medo da Nova Música: A Revolução da IA e o Conservadorismo Invisível nas Ondas do Rádio
Radialistas da Mix criticam a Inteligência Artificial
Recentemente, estava ouvindo a Rádio Mix FM quando os locutores começaram a debater — por horas — uma pergunta que, na superfície, parece simples:
"Você ouviria uma banda ou músicas geradas por Inteligência Artificial?"
O que deveria ser um debate curioso e informativo sobre o futuro da música virou, aos poucos, um ataque disfarçado à criação com inteligência artificial. E o que mais me chamou a atenção não foi a dúvida sobre o uso da IA, mas o tom de medo e rejeição à tecnologia, como se estivéssemos diante de uma ameaça existencial.
O mesmo discurso, século após século
A fala dos radialistas me soou familiar. Não pelo conteúdo em si, mas pela postura:
"Isso não é humano. Isso não tem alma. Isso não é aprovado."
Lembrei, imediatamente, do que diziam quando o rádio foi lançado.
— "As pessoas vão ficar hipnotizadas, perder a capacidade de pensar."
E depois, com a chegada da televisão:
— "A TV vai atrofiar os cérebros, emburrecer as massas."
Agora, com a inteligência artificial, escutamos as mesmas críticas, o mesmo medo e o mesmo moralismo tecnológico.
IA não é vilã. É ferramenta.
A parte mais preocupante foi quando a radialista afirmou que o que eles dizem no ar está "aprovado" por um grupo de pessoas — e por isso é confiável e verdadeiro.
A mensagem por trás dessa frase me preocupa profundamente: se não foi aprovado, não é bom. Se não foi autorizado, não pode ser confiado.
Ao mesmo tempo que acusam a IA de ser perigosa porque "faz as pessoas pararem de pensar", eles próprios parecem defender que o público acredite sem questionar — desde que venha de uma fonte "oficial".
E aí está o paradoxo: criticam a IA por alienar, mas praticam exatamente isso.
Inspirar-se não é plagiar
Outro argumento foi o de que a IA "rouba" músicas para aprender a compor.
Mas… todos nós aprendemos ouvindo outros artistas. Todo músico foi influenciado por músicas anteriores, todo artista tem referências. O problema não é a inspiração. É o uso indevido — e isso deve ser tratado com seriedade, claro — mas não pode ser motivo para demonizar toda uma tecnologia.
Além disso, a IA não compõe sozinha, do nada. Há pessoas por trás. Alguém precisa escrever os prompts, ajustar os parâmetros, revisar, experimentar. Criar com IA dá trabalho, exige criatividade e domínio técnico.
Hipocrisia tecnológica
A crítica mais absurda, porém, é a hipocrisia no uso da IA:
— "Não pode usar IA para criar música, mas pode para editar vídeo, criar roteiro, legendar, fazer capa, post, cortar áudio…"
Então a pergunta que não quer calar:
Por que a música é o único território sagrado?
Se você pode usar IA para absolutamente tudo — por que não para criar arte?
Talvez o que esteja em jogo seja o ego humano, que teme ser superado. Mas não é a IA que rouba empregos. São pessoas que aprendem a usar IA que passam à frente de quem não se atualiza.
Você saberia distinguir?
E se a música criada por IA for tão boa que você nem perceber?
Como saber se aquela melodia incrível ou aquela letra que te tocou foi escrita por um humano ou por uma máquina?
E mais: isso realmente importa, se a música te emocionou?
Se você só ama a música porque acha que foi feita por alguém “autorizado”, talvez o problema não esteja na IA — mas em como você aprendeu a julgar valor.
Hora de amadurecer o debate
O que vimos na Rádio Mix foi um discurso retrógrado e raso — que ignora o potencial criativo e libertador da IA. E o pior: vindo de pessoas que já usam IA no dia a dia, mas se recusam a aceitá-la em um dos espaços mais humanos que existe: a música.
Isso não é uma crítica pessoal aos locutores. É um alerta para um movimento maior que se espalha entre influenciadores, mídias tradicionais e formadores de opinião que preferem alimentar o medo em vez da consciência crítica.
A revolução da IA na música não é uma ameaça. É uma nova forma de expressão.
E como toda nova linguagem, ela exige aprendizado, ética, abertura e criatividade.
Não podemos repetir os erros do passado. Está na hora de escutar com outros ouvidos.
A pergunta principal é: E quando chegar a nossa vez? Vamos lutar contra ou nos preparar para as mudanças?